2º Dia no
Chile (dia 10 do mochilão)
Depois de dormir sem jantar, acordamos as 6h mortos de fome. O Hostel Athenas em que estávamos hospedados em Arica não servia o desjejum e como faríamos o passeio ao Parque Lauca, teríamos que tomar o desayuno pelo caminho.
Aguardamos o guia para nosso tour do dia que seria ao Parque Nacional
Lauca que fica no extremo norte do Chile na região de Tarapacá, ao leste da
cidade de Arica. O parque de 138.000 hectares oferece extraordinárias atrações
naturais, incluindo vulcões ativos, lagos de águas azuis e amplas planícies que
servem de refúgio de grandes populações de vicunhas, lhamas e alpacas. Considerado
Reserva Mundial da Biosfera pela UNESCO é atualmente o lar de mais de 130 espécies
de aves.
É possível fazer um passeio com
mais dias em que se conhece as áreas protegidas adjacentes ao parque, como a Reserva Nacional las Vicuñas e o Monumento Nacional Salar de Surire,
mas como nosso tempo era curto, teríamos apenas um único dia para explorar a
região.
Pegamos as mochilas e fechamos
a conta no hostel, pois não voltaríamos após o tour. O ônibus da “Turismo Lauca” passou para nos buscar por volta
das 7h e seguiu na direção da orla da Playa
La Lisera parando para buscar mais turistas no caminho.
Deixamos a cidade percorrendo a
rota internacional que segue em direção à Bolívia. A estrada margeia o Valle de Azapa, um verdadeiro Oasis no
meio do deserto, famoso por conta dos geóglifos com contornos humanos e de
animais em suas colinas. Estudiosos afirmam que estas imagens remontem ao
período de ocupação inca na região.
Vale de Azapa em meio ao desrto |
Infelizmente só conhecemos o
Valle de Azapa e os geóglifos pela janela do ônibus.
Seguimos por aproximadamente 30 Km e a paisagem desértica que víamos pela janela ia dando lugar a vegetação com campos verdes nos arredores do Valle de Lluta.
Nossa primeira parada foi no
vilarejo de Poconchile, que cresceu as margens do Rio Lluta que dá nome ao vale
em que a cidade se encontra.Geóglifos de Azapa |
Vale de lluta |
Depois de mais de dezoito horas
sem comer e tendo a última refeição como um lanche de fast food, a parada foi um alívio. O desayuno não estava incluso no pacote, mas paramos em um
restaurante para os que quisessem (como nós) pudessem comer algo. Começamos ali
a conhecer alguns dos nossos companheiros no passeio, entre eles o Vinícius, um
paulista que viajava sozinho entre Peru e Chile.
A atração principal em
Poconchile é a pequena Iglesia de San
Jerónimo que é a mais antiga entre as igrejas coloniais existentes no norte
do Chile. Foi erguida por padres espanhóis em 1580 para evangelização do povo
Aymará que vivia na região.
Infelizmente a igrejinha estava
em obras para restauração e não pudemos nem chegar perto, pois os tapumes
cobriam a fachada que não apresentava a cor branca característica.
Nos restou apenas a visita ao
pequeno cemitério de San Jerónimo de
Pocanchile nos fundos da igreja que rendeu bonitas fotos, apesar de um
pouco mórbidas... rs
Seguimos no ônibus até um ponto
conhecido como “Quebrada de Cordones”, na estrada em meio ao deserto. Neste
ponto pode-se observar os Cactos Candelabros, uma espécie que cresce em
altitudes acima de 2.000 metros.
Com altura média de 3 metros e
podendo chegar aos 5 metros, esta espécie de cacto possui o tronco alto e limpo
com ramificações nas pontas, lembrando um grande candelabro.
Seguimos pela estrada no
deserto por mais um tempo e paramos diante do mirante do Vale de Lluta, de onde
é possível avistar o vale com o Rio Lluta abaixo. Aproveitamos para algumas
fotos.
Vale de Lluta |
Neste ponto o guia nos explica
que toda a região norte do Chile era dominada pelos povos Aimarás, que
posteriormente foram subjugados pelos Incas, mas que ainda hoje formam a
segunda maior comunidade indígena do país, com cerca de 48.500 pessoas. A nossa
frente pudemos observar ruínas que foram fortalezas Aimarás construídas entre os
anos 1000 e 1450 d.c., ano em que os incas passaram a dominar a região.
Observamos com atenção enquanto
o guia explicava que estas construções são chamadas “Pukarás” e que nos
períodos de paz eram acomodações para famílias enquanto nos períodos de guerra
o lugar era transformado em fortaleza.
As pukarás, que foram
construídos com pedra e lama, transformavam encostas em terraços e o topo
funcionava como ponto estratégico de observação dos inimigos. O acesso íngreme
ampliava a proteção.
Deixamos o vale e seguimos
cruzando belas planícies com montanhas ao fundo, sob um céu extremamente azul.
As paisagens pela janela do ônibus eram sempre lindas, não importa para que
lado se olhasse.
No meio do caminho uma grata
surpresa: Uma solitária viscazia. Um
tipo de coelho do deserto que é típico da região mas difícil de se ver, pois
vive em tocas entre as rochas e possui hábitos noturnos. O motorista avistou o
bichano e parou próximo o bastante para que pudéssemos admirá-lo sem o
afungentar.
Pela janela pudemos observar alguns
grupos de vicunhas, que são os menores camelídeos entre as espécies andinas. Estes
são animais selvagens que vivem em altitudes acima de 3.000 metros do nível do
mar e que não podem ser domesticados, pois morrem do coração durante o
aprisionamento. As vicunhas possuem pelagem constituída da lã com a melhor
qualidade que se conhece, sendo muito valorizada e por este motivo sempre foi
alvo de caçadores, chegando a estar próxima da extinção. O guia explica que a
criação do Parque Nacional Lauca e da Reserva Nacional Las Vicuñas fez com que
o número destes animais subisse de menos de 25.000 para mais de 170.000 nos
dias de hoje.
O ônibus continua a subir pela
estrada de terra e a paisagem desértica vai mudando aos poucos até que atingimos
mais de 4.000 metros acima do nível do mar, quando chegamos em nossa próxima
parada, a Laguna Cotacotani.
Na verdade um complexo lagunar
formado em meio as montanhas andinas. O guia explica que o nome da laguna vem
da expressão “quta-qutani” que quer
dizer “conjunto de lagunas” na língua Aymara.
Eu, Cotacotani e os vulcões |
Segundo o guia, o Vulcão Pomerape
tem o cume a aproximadamente 6.280 metros acima do nível do mar, enquanto o Parinacota
atinge os 6.350 metros acima do nível do mar.
Voltamos para o ônibus e de
volta à estrada pudemos ver que o complexo lagunar é imenso e possui diversas
ilhas formadas por rochas vulcânicas, resultado das erupções nas montanhas ao
redor.
Seguimos alguns quilômetros até
um dos poucos locais aonde ainda se fala o dialeto Aymará no Chile, a pequena
vila que dá nome ao lugar: Parinacota.
O pequenino vilarejo é um
rústico povoado no meio do nada! A população é de cerca de 70 famílias, mas no
momento em que chegamos parecia uma cidade fantasma, já que a grande maioria
dos seus habitantes estava nas áreas de criação de lhamas trabalhando com seus
rebanhos.
As pequenas casas da vila foram
construídas ao redor de uma pequenina igreja erguida com pedra vulcânica e
barro no começo do século XVII e considerada Patrimônio Histórico da Humanidade.
O templo tem o teto sustentado
por vigas de eucalipto entrelaçadas por pele de lhama, mas infelizmente estava
fechado quando chegamos. O guia explica que a chave fica com um morador local,
mas que naquele momento ele estava nas montanhas, então não conheceríamos o
interior da igreja.
Caminhamos entre as casas
simples e ruas de terra no meio da imensidão do deserto. O guia nos deixou
livres por trinta minutos para conhecer o lugar e tirar fotos.
A vila está aos pés de uma
pequena colina e seguimos um caminho que levava ao topo. Subir andando uma
elevação a quase 4.500 metros acima do nível do mar não é fácil. O guia havia
dito que deveríamos caminhar bem devagar e parar para respirar sempre. No
início achei exagero, mas admito que a subida que parecia fácil foi quase
impossível.
Por fim chegamos ao topo onde
está um ornamentado cruzeiro. Do alto pode-se ver a pequena vila de Parinacota
no meio das areias e pedras do deserto. Um tempo para respirar e era hora de
descer e deixar a simpática cidade para trás.
Voltamos para a Ruta CH-11, conhecida como “Rota do Deserto” que
atravessa Parinacota em direção a La Paz. Iríamos seguir por mais 4 Km até o
Lago Chungará, antes do Paso Fronteriço
de Tambo Quemado na divisa com a Bolívia.
Quando finalemente chegamos a
região do Lago Chungará fiquei abismado com a paisagem. O lugar é lindíssimo e
de fácil acesso, uma vez que a rodovia margeia o lago.
O Chungará está localizado a
4.500 metros acima do nível do mar e é considerado o lago mais alto do mundo
(estando em cota acima do Titicaca que é o lago navegável mais alto que
existe). O guia nos conta que o lago possui uma superfície de 22 Km² e sua
profundidade atinge os 35 metros no ponto mais fundo.
Dali podemos admirar o Vulcão
Parinacota, localizado na fronteira entre Bolívia e Chile.
O guia explica que o vulcão possui uma cratera de 500 metros de diâmetro e 100
metros de profundidade e que o nome “Parinacota” quer dizer “Lago dos
Flamingos” na lingua indígena Aymara.
O lago tem como principal
afluente o Rio Lauca, que dá nome ao Parque Nacional, e é o principal
responsável pelo abastecimento da Laguna Cotacotani que havíamos visitado
anteriormente. O guia explica que o fluxo subterrâneo do Chungará abastece
todas as lagunas da região.
A beleza da paisagem
impressiona qualquer visitante. O Parinacota possui um glaciar permanente acima
da cota de 5.200 metros, e é refletido nas águas do lago como uma pintura viva
a nossa frente.
A fauna da região é outro ponto
alto da visita, pois é possível observar a presença de flamingos e jarinas
gigantes (uma espécie de pato andino) se alimentando nas águas no Chungará.
Era a hora de voltar para
Arica, mas antes teríamos uma última parada para o almoço na cidade de Putre,
cujo valor já estava incluso no pacote do tour.
No caminho de volta pudemos ver as pastagens de criação de Lhamas de
Parinacota.
O caminho de volta é bem
cansativo e a parada para almoço ainda está a longínquos 140 Km de distância de
Arica. Putre está a 3500 metros acima do nível do mar e é a capital da
província de Parinacota, mas apesar disso é um vilarejo pequeno e simples onde
o tempo parece não passar.
Sentamos para almoçar e jogar
conversa fora com nossos novos amigos de viagem e descobrimos que o Vinícius
também iria para o Atacama quando deixasse Arica. Aproveitamos o tempo após o
almoço para um rápido passeio nos arredores da praça da cidadezinha. Todo o
lugar é muito bem cuidado, com jardins verdejantes, apesar de estarmos no meio
do deserto andino.
Uma pena que a igreja
construída em 1670 e restaurada em 1871 estivesse fechada. Sempre procuramos
visitar as igrejas históricas quando viajamos, mas neste dia não demos sorte em
nenhum templo e só pudemos olhar por fora.
O retorno à Arica foi
silencioso, já que a paisagem desértica e o balanço do ônibus eram um convite a
um cochilo pós-almoço. Ao chegar percorremos a cidade mais uma vez, enquanto os
companheiros de tour eram deixados em seus respectivos hotéis. Nos despedimos
do Vinícius quando ele desceu próximo a praia na região costeira onde ficava
seu hostel e pedimos ao motorista que nos deixasse na rodoviária, pois havíamos
encerrado nossa estadia no hostel e tomaríamos o ônibus para San Pedro de
Atacama a noite.
Eram mais de 20h quando
chegamos no Terminal Terrestre Nacional de Arica, o lugar estava lotado e
parecia que todos os ônibus já estavam com os lugares esgotados. Havíamos
comprado as passagens na Buses Frontera
Del Norte ($ 10.000 por pessoa), com destino a San Pedro de Atacama com uma
“conexão” em Calama. Olhando o movimento me dei conta de como foi importante
ter comprado as passagens no dia anterior quando chegamos a cidade, pois a
rodoviária estava um caos.
Aproveitamos para ir ao banheiro
e depois tive que enfrentar uma verdadeira guerra para chegar até o guichê do
pagamento da taxa de embarque. Aline ficou me aguardando com as mochilas (não
dava para andar com mochilas nas costas), próximo a porta da área de embarque,
onde havia um pequeno aparelho de TV passando o noticiário local.
Uma nova guerra para chegar até
a porta de embarque, junto a Aline e finalmente entendi o que estava
acontecendo na cidade e porque tanta gente procurava passagens para fora: Um
terremoto de 6,5 graus na escala richter havia sacudido a região de Iquique e
foi sentido em Arica, fazendo com que as sirenes de alerta de Tsunamis soassem
na cidade.
O noticiário na TV era do tipo
sensacionalista e ficava repetindo cenas de evacuação das praias de Iquique e
Arica e a grande parte dos turistas estava ali na rodoviária procurando sair da
cidade em alerta. Tudo isso havia acontecido a pouco tempo enquanto estávamos retornando
das montanhas de Parinacota e me dei conta que o guia havia deixado muita gente
nas áreas de praia, evacuadas por segurança, sem saber do risco. Lembramos
imediatamente do nosso novo amigo paulista Vinícius que havia descido do ônibus
na costa.
O ônibus da Frontera Del Norte encostou na
plataforma de embarque e as 21h30min e embarcamos para uma viagem noturna em
direção a San Pedro de Atacama, com uma parada de 1h30min na cidade de Calama.
Antes de adormecer ainda me lembrei que minha intenção original era ir de Arica
para Iquique e só depois para Atacama e que se fosse assim estaríamos com
passagens para a cidade epicentro do terremoto e de onde todos fugiam. Concluí
que foi um grande golpe de sorte nosso caminho não se cruzar com o terremoto,
apesar de estarmos tão perto. Recostei o assento do ônibus e dormi contente por
estar indo para longe dali, sem saber que aquele seria o primeiro terremoto de
uma série de tremores na região e que, em uma semana, culminaria com um grande evento
trágico de repercussão internacional, que envolveria até o desabamento de parte
do morro de Arica. Felizmente isso tudo iria acontecer quando já estivéssemos
bem longe dali...
Gastos
para 2 pessoas em 16/03/2014:
- Desjejum:
$ 2.800,00 CLP
- Lanche:
$ 4.100,00 CLP- Água: $ 750,00 CLP
- Banheiro: $ 300,00 CLP
- Taxa de embarque: $ 400,00 CLP