Nossa despedida do norte português se deu nos arredores da famosa
Serra da Estrela. Escolhemos a cidade de Guarda para hospedagem e alugamos um
carro para percorrer os arredores. No último dia ficamos em Guarda e de lá
tomamos um ônibus rumo a Espanha.
Nos hospedamos no Hostel Residência Filipe no centro de Guarda e
alugamos um carro para conhecer os arredores. Depois do primeiro dia pelas
aldeias históricas (conforme contei no último post) seguimos pela rodovia N-18
em direção a cidade de Belmonte.
Belmonte
Saindo do hostel, em Guarda, percorremos 24 Km pela rodovia
secundária N-18 até Belmonte. Escolhemos esta rota ao invés da rodovia principal,
pois a A-23 possui pedágios no caminho, além do que a Serra da Estrela seria
nossa paisagem pela janela.
Belmonte |
Belmonte é a terra natal da família Cabral e seu filho mais
ilustre foi Pedro Álvares Cabral. O navegador que primeiro chegou ao Brasil era
filho de Fernão Cabral, conhecido como “Gigante das Beiras” devido a sua grande
força física. Uma estátua em tamanho real em uma bonita e florida praça da
cidade lembra o navegador e em meio as flores da praça uma pedra reproduz as
palavras de Pero Vaz de Caminha escritas no dia do descobrimento.
A primeira parada que indico na cidade é na moderna Igreja da
Sagrada Família, que foi fundada em 1940. Na fachada uma grande faixa comemorava
os 500 anos de evangelização no Brasil.
Mas antes que você se pergunte por que indiquei conhecer uma
igreja da década de 1940 em meio a tantas construções históricas importantes,
saiba que esta igreja guarda em seu interior um objeto que esteve na Nau que
veio até o Brasil em 1500.
Moderno interior da igreja |
Sagrada Família no altar |
A imagem de Nossa Senhora da Esperança, exposta em um altar lateral
da igreja, navegou com Pedro Álvares Cabral na embarcação que chegou em 22 de
abril de 1500 em terras desconhecidas para os portugueses. Feita de madeira no
século XIV a imagem está exposta ao lado de uma réplica da imagem de Nossa
Senhora Aparecida, hoje padroeira do Brasil.
Outra igreja que merece uma visita é a que está dedicada a São
Tiago. Talvez por afinidade de nome (rs) eu sempre busco conhecer as igrejas de
São Tiago, mas por algum motivo elas estão sempre fechadas... A única que vi
aberta tinha se tornado uma livraria em Óbidos e já não era uma igreja, apesar
de aparentar (mas isso já contei antes).
Igreja de São Tiago de Belmonte |
Para não perder o costume a igreja estava fechada e tive que me
contentar com conhecer a fachada da igreja e da pequena capela do século XIII
que está ao lado. Fazer uma oração na Igreja de São Tiago de Belmonte era um
dos meus objetivos na cidade devido a coincidência dos nomes do santo e do
lugar com meu, mas infelizmente não foi possível...
Detalhe do Sino na torre da igreja |
São Tiago na fachada |
Passamos algum tempo na cidade em meio as suas casas de pedra,
bons restaurantes e pequenas lojas de guloseimas portuguesas.
Belmonte origina de “Belo Monte” e realmente é uma bonita colina
com um grande Castelo no topo e a cidade em volta. O Castelo, que pertencia a
família Cabral, foi o lugar de nascimento do descobridor do Brasil. Na torre principal do castelo pode-se ver as bandeiras de Brasil e
Portugal expostas lado a lado nos fazendo lembrar a pequena relação existente
entre nosso país, esta cidade e principalmente este castelo.
O Castelo de Belmonte que pertenceu a família Cabral e onde nasceu Pedro Álvares Cabral |
Próximas ao castelo estão a Capela de Santo Antônio, que tem o
brasão da família Cabral talhado em pedra na fachada, e a Capela do Calvário. A
primeira é mais antiga, sendo do século XV, enquanto a segunda foi construída
no século XIX.
Capela de Santo Antônio |
Brasão de armas da família Cabral na fachada da capela |
Capela do Calvário a frente e Capela de St. Antônio ao fundo |
Deixamos Belmonte de volta pela N-18 e logo avistamos a Centum Cellas, uma torre romana que pode
ser vista da estrada, no lado esquerdo da rodovia. A estrutura de três andares
é um mistério arqueológico, já que não se sabe ao certo para que era usada,
podendo ter sido uma base militar do império romano, um albergue de estrada
para tropas ou até mesmo algum templo.
Seguimos para a cidade de Almeida, voltando pelo percurso que
fizemos de manhã pela N-18 e seguindo pela rodovia A-25 depois de passar por
Guarda. Ao todo foram aproximadamente 70 Km neste percurso.
Almeida
A cidade fortificada de Almeida possui sua muralha em forma de uma
estrela de doze pontas e o acesso a ela se dá cruzando uma ponte sobre um fosso
e um túnel por dentro dos portões, como nos filmes hollywoodianos.
Muralha e portão de entrada da cidade fortificada de Almeida |
Fosso ao redor da muralha externa de Almeida |
Entrando pelas Portas de São Francisco, o portão principal,
cruza-se um túnel que guarda um arsenal que abriga lembranças militares do
passado da fortaleza, no agora Museu Histórico Militar de Almeida, que está
montado por dentro das muralhas.
Túnel de entrada por dentro da muralha |
Portão por dentro da fortaleza |
Almeida está localizada na fronteira entre Portugal e Espanha e já
foi território de disputa entre os dois países, mesmo depois do reconhecimento
oficial, em 1297, por parte da Espanha como sendo território português.
A cidade fortaleza foi projetada em 1641 depois que Filipe IV, da
Espanha, destruiu as defesas anteriores da cidade e também seu castelo
medieval.
Ruas e becos da pacata Almeida |
Muitas guerras e invasões marcaram as ruas e construções da cidade-fortaleza |
Caminhamos pelas ruas simples da cidade-fortaleza imaginando
quantas batalhas já foram travadas neste lugar, pois entre os anos de 1742 e
1743 a cidade voltou a estar em mãos espanholas até a Guerra Peninsular, quando
a cidade foi tomada pelos franceses.
A cidade chegou a ser tomadas pelos ingleses e depois, no ano de
1810, sofreu um grande cerco de tropas francesas que culminou com a destruição
total do castelo da cidade.
Em meio a tantas guerras, que com certeza mataram muita gente,
encontramos um monumento aos mortos da Primeira Guerra Mundial e nenhuma lembrança
aos mortos nesta cidade durante as demais batalhas...
Umas das construções mais antigas da cidade é a Igreja da
Misericórdia, do século XVII, que fica ao lado do prédio da Santa Casa da
Misericórdia.
igreja da Misericórdia e Santa Casa |
Santa Casa de Misericórdia de Almeida |
Em uma grande praça está um prédio do século XVIII que abrigou o
antigo corpo de guarda principal da cidade e onde hoje encontra-se a Câmara
Municipal de Almeida. Próximo a este está o prédio do Tribunal e Registro Civil
que já foi Casa dos Governadores nos séculos XVII e XVIII.
Câmara Municipal |
Tribunal de Registro Civil |
Caminhar pelas ruas de Almeida é praticamente como voltar ao
passado, em charmosas ruas que misturam casas de pedra e de alvenaria, que
mostram as marcas de uma cidade que já foi muitas vezes reconstruída.
No lugar onde um dia esteve o Castelo de Almeida estão hoje o
cemitério e uma torre com um relógio. A torre, datada de 1830, foi erguida
sobre as fundações da torre sineira da Igreja Matriz de Nossa Senhora das
Candeias, destruída junto com o castelo em 1810.
Na entrada do cemitério uma frase recebe os visitantes de forma mórbida,
mas extremamente verdadeira: “Ó tu quem quer que és, repara como eu estou. Eu
já fui como tu és e tu serás como eu sou”.
Voltando pelas ruas de Almeida podemos ver o fosso que separa a
cidade dos muros externos, margeando as ruas e construções da cidadela.
Fosso ao redor da cidade com o local do antigo castelo ao lado |
O fosso de Almeida |
Caminhamos até o muro da cidade e subimos por uma escadaria e
depois seguimos por cima, observando a cidade em seus limites e seguindo até a
porta principal novamente.
Serra da Estrela
Tomamos a estrada de volta, indo no sentido da Serra da Estrela,
na região da Guarda. O fim do dia se aproximava e resolvemos ver o pôr-do-sol
do alto das colinas da serra.
Cruzamos pelo Vale de Estrela e seus lugarejos pequenos, subindo e
descendo pelas encostas da serra. A Serra da Estrela é repleta de imensos
“cata-ventos” responsáveis pela geração de energia eólica.
Portugal tem um grande parque eólico possuindo mais de 2.500
aerogeradores, ocupando todas as zonas montanhosas do país.
O fim do dia no alto da serra é bem bonito, com o sol baixando no
horizonte, pintando o céu de laranja. Paramos o carro em um recuo junto ao
acostamento no topo de uma colina e esperamos o sol desaparecer atrás dos
contornos do relevo a frente.
Pôr-do-sol no alto da Serra da Estrela |
Fim do dia com o céu laranja marcando o contraste dos aerogeradores na Serra da Estrela |
O céu ainda escurecia quando retornamos a cidade de Guarda.
Aproveitamos o carro alugado para ir até a rodoviária e comprar as passagens
para Salamanca, na Espanha, para o dia seguinte. No fim do dia paramos para
comer no Shopping Center Vivaci no centro histórico de Guarda.
Estrada de volta a Guarda: Descendo a Serra em direção ao vale de Estrela no fim do dia |
Guarda vista da estrada durante o anoitecer |
Guarda
Apesar de já estarmos na cidade a duas noites, deixamos para
conhecer o lugar no último dia. Depois de rodar um pouco pelos arredores com o
carro alugado, era hora de devolver o veículo. Minha dica para quem quiser
conhecer a região é alugar um carro, pois os castelos e outras atrações da
região ficam distantes e as estações de trem ficam longe dos centros, fazendo
com que se tenha que pegar taxis e ônibus (estes com horários nem sempre
agradáveis).
As locadoras de Guarda não ficam próximas ao centro histórico e
quando alugamos fomos até lá de taxi (que foi quem nos indicou onde alugar), na
volta da locadora tomamos um ônibus com destino a região central novamente.
O centro histórico de Guarda não é grande e pode-se percorre-lo
tranquilamente a pé. Caminhando pode-se ver o que restou da antiga muralha que protegia
a cidade, que foi demolida, junto com muitas outras construções, ao longo do
século XIX para dar lugar a expansão urbana da cidade. As pedras retiradas dos
muros, portões e castelo medievais foram usadas nas ruas e novas construções.
Junto a muralha está a Porta do Sol, ou Porta da Erva, que foi a
antiga entrada para a judiaria de Guarda e marcava a área onde existia uma
grande comunidade judaica no século XIII.
Porta do sol: Entrada para a judiaria de Guarda |
Chama a atenção uma torre quadrangular conhecida como Torre dos
Ferreiros, por guardar a porta de mesmo nome. Construída a mando do Rei D.
Dinis com pedras provenientes da Igreja de Nossa Senhora da Consolação a torre
apresenta dois vãos de acesso que formavam uma entrada pela muralha.
No vão entre as duas portas, por dentro da torre, está um oratório
com a imagem do Cristo Crucificado, conhecido como Senhor dos Aflitos.
Antiga Porta dos Ferreiros e oratório do senhor dos aflitos |
Guarda foi fundada no século XII por D. Sancho I, segundo rei de
Portugal, que hoje tem sua estátua exposta na Praça Luís de Camões, diante da
Igreja da Sé.
A Catedral da Sé é uma impressionante igreja que começou a ser
construída no final do século XII, mas que demorou 400 anos para ser concluída.
Eu diante da grandiosa Catedral da Sé |
Com o passar dos séculos os estilos arquitetônicos foram mudando,
mas a igreja, que ganhou detalhes góticos e manuelinos, não deixou de ter uma
aparência de fortaleza quando vista de fora.
Dentro da enorme catedral em forma de cruz estão diversos túmulos
espalhados pelo piso, cena comum nas igrejas medievais quando se sepultavam os
devotos no interior do templo, antes de a peste negra mudar este hábito, pois
depois passou-se a enterrar os mortos nos terrenos atrás das igrejas e não mais
em seu interior.
No altar-mor está um grande retábulo de pedra, datado do ano de
1553, constituído de mais de cem figuras esculpidas em alusão a cenas do Antigo
e Novo Testamento. No centro uma invocação de Nossa Senhora da Assunção,
padroeira da cidade.
Caminhando pelas ruas da Guarda é possível admirar belas e antigas construções que remetem ao passado medieval, alguns hoje dedicados ao turismo de habitação (com preços altíssimos).
Solar construído em 1686 com uma capela anexa |
No alto de uma colina na Serra da Estrela, a cidade de Guarda é a
mais alta de Portugal, estando a 1056 metros acima do nível do mar e no ponto
mais alto da cidade ergue-se a Torre de Menagem, parte do antigo Castelo da
Guarda, onde funciona um pequeno museu sobre a cidade.
Guarda é uma cidade comum e apesar de o centro histórico ser
interessante, não acho que tenha nada de excepcional por lá e que já não se
tenha visto em muitas outras cidadelas portuguesas. Voltamos caminhando até a
Hospedaria Filipe para encerrar nossa estadia e aproveitamos para conhecer a
Igreja da Misericórdia que fica diante do hostel.
Interior da igreja |
Feita nossa última oração era hora de seguir até a rodoviária para
pegar o ônibus para Salamanca e nos despedir de Portugal. É possível caminhar
até o terminal de ônibus para quem está com mochila nas costas, mas a caminhada
é um tanto longa. Se estiver com mala de rodinha, pegue um táxi!
Casario com os balcões típicos |
A fronteira terrestre entre Portugal e Espanha é tranquila de se
atravessar e eu que queria um carimbo espanhol em meu passaporte fiquei só na
vontade.
Na fronteira, próxima a cidade de Almeida, o ônibus encosta e um
policial espanhol entra no veículo para olhar os documentos de todos. Eu estava
preparado para pedir ao guarda que carimbasse meu passaporte, mas nem descemos
do veículo, pois ele somente olhou a foto e nosso rosto e se foi. Não tinha um
carimbo, nem nada com ele! Fiquei chateado, mas pensei que quando retornasse a
Portugal, pelo sul, vindo da Espanha iria conseguir o carimbo (ledo engano)...
Lado espanhol da fronteira: Ciudad Rodrigo |
Gastos
para 2 pessoas em dois dias em Março de 2015:
- Taxi
para locadora de carro em Guarda: € 4,00
- Aluguel
do carro (Fiat Panda): € 51,56- Almoço: € 16,35
- Hostel (Hospedaria Filipe): € 60,00
- Jantar (lanche a noite): € 6,80
- Passagens para Salamanca: € 64,00
- Gasolina: € 18,27
- Ônibus da locadora para o centro de Guarda: € 2,00
- Museu da Guarda: € 6,00
- Almoço: € 12,48
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